Considerações iniciais
O futebol é um grande fenômeno sociocultural no Brasil, impactando a economia, a política e o dia a dia de milhões de brasileiros. O fenômeno futebolístico pode ser atestado a partir dos inúmeros estádios para o esporte, com enorme capacidade de público, localizados ao longo de todo o país. Além disso, é tão difundido culturalmente que é difícil não conhecer algum brasileiro que não tenha praticado o esporte (PEDROSA, 1967). Apesar da tamanha popularidade, é curioso que a produção literária brasileira não tenha abordado muito o esporte, com exceção de gêneros específicos como nas autobiografias, biografias, crônicas ou perfis. No entanto, para além da crônica, há uma produção literária considerável em que o esporte também se faz presente: a literatura infantil e infanto-juvenil. Como o futebol é bastante presente na socialização das crianças brasileiras, não é de se estranhar que ele também “entre em campo” nas quadras das letras infantis e juvenis. Com isso em mente, pretendemos neste artigo compreender o papel e o surgimento do futebol na literatura brasileira, assim como a contribuição da literatura infantil e infanto-juvenil no escopo maior da chamada literatura de futebol. Faremos isso a partir de um diálogo com a contribuição de pesquisadores que se debruçaram no tema da literatura de futebol e um levantamento da publicação de obras de literatura infantil e infanto-juvenil brasileira de futebol.
Mapeando o futebol na literatura
O paradoxo ante a relativamente escassa produção literária brasileira em relação ao futebol não é uma questão recente. Milton Pedrosa em seu texto de 1967, “O futebol na literatura brasileira”, e Ivan Cavalcanti Proença no texto de 1981, “A literatura no (do) futebol”, já se depararam com esse fenômeno. O primeiro realiza uma pesquisa bibliográfica da publicação de obras de literatura que tratam do esporte em questão, sendo um trabalho pioneiro neste quesito. Vale notar que há um recorte específico por parte do autor sobre o que ele irá considerar por “literatura” em sua publicação. A literatura a qual Pedrosa visa abordar é aquela de “cunho artístico-literário”, que “abrange o romance, o conto, a crônica, o artigo, o ensaio, a peça de teatro, a poesia, o cinema, os campos da medicina e da legislação” (PEDROSA, 1967, p. 13.). Com esse recorte, o autor faz um levantamento de textos da literatura brasileira que tratam do futebol, tanto de forma central quanto periférica na obra. Assim, ele passa por publicações, em geral, de autores da primeira metade do século XX, como Lima Barreto, Aníbal Machado, Monteiro Lobato, José Lins do Rego, Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Carlos Drummond de Andrade, entre outros (PEDROSA, 1967). Conforme o texto, a produção literária de futebol recrudesce de fato a partir de 1940, sobretudo na crônica, ao mesmo tempo em que é relegado em outros gêneros literários: “Os trabalhos predominantes pertencem à categoria de crônica: raros às de romance, conto, poesia, teatro, cinema e ainda menos os que relacionam o tema à medicina, ao direito ou às artes plásticas” (PEDROSA, 1967, p. 15). Em virtude da pouca produção sobre futebol nos demais gêneros literários que o autor abrange, paira o questionamento sobre o porquê disso: afinal, se o futebol é tão presente na cultura brasileira como um todo, por quê nossos autores não se debruçaram tanto nele?
Nesse sentido, Milton Pedrosa irá tentar entender esse fenômeno através de uma ótica social. A princípio, o futebol, desembarcando no Brasil através de marinheiros ingleses, era um esporte praticado majoritariamente pelas camadas mais ricas da população, pelo contato que possuíam com a Europa. Nesse primeiro momento, “o futebol era uma coisa chique” (PEDROSA, 1967, p. 18). Posteriormente, o futebol começa a atingir seu caráter de esporte das massas quando os anteriormente excluídos dos clubes de elite “ascendem finalmente às primeiras filas e são figurantes diretos do futebol em expansão” (PEDROSA, 1967, p. 19). Assim, as camadas mais pobres da população, os operários, os negros, etc, jogando onde podiam, foram se organizando e criando uma nova imagem do futebol. Quando isso ocorre, como não podia deixar de ser numa sociedade elitista como a brasileira, o futebol passa a ser mal visto…
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