THE NEW YORK TIMES – Trabalhadores trajando coletes laranja-claro usados na construção civil apareceram em uma casa da capital nicaraguense, Manágua, com ferramentas para arrombar a fechadura e arrancar prateleiras. Dias depois, funcionários da Procuradoria-Geral foram a outra residência da cidade e afirmaram que o imóvel tinha passado a ser propriedade do Estado. Os homens que chegaram em picapes da polícia a uma terceira casa em Manágua, num subúrbio arborizado, carregavam marretas.
“Eles estavam prontos para arrombar a porta”, afirmou o cineasta Camilo de Castro, cuja obra é crítica ao governo, a respeito da chegada dos policiais à sua residência.
Castro e os proprietários dos outros dois imóveis, Gonzalo Carrión e Haydee Castillo, são ativistas defensores dos direitos humanos que figuram entre mais de 300 nicaraguenses declarados traidores este ano pela ditadura sandinista, perdendo direito a nacionalidade e propriedade.
Agora, a ditadura de Daniel Ortega começou a tornar oficial esse tipo de repressão política de maneira absolutista confiscando propriedades de seus oponentes, incluindo as residências de dois ex-ministros de Relações Exteriores.
A campanha remonta ao primeiro período que os sandinistas passaram no poder, nos anos 80, em que o partido esquerdista expropriou imóveis desencadeando anos de disputas jurídicas. O atual líder do país, Daniel Ortega, liderou a Revolução Sandinista que colocou o grupo no poder e vive em uma casa que ele mesmo confiscou décadas atrás.
Ortega foi derrotado nas urnas em 1990, mas após mudanças na Constituição que tornaram possível que ele vencesse, reconquistou a presidência em 2007. Ortega passou a década seguinte desgastando a democracia da Nicarágua por meio de interferências na Assembleia Nacional, no processo eleitoral e na Suprema Corte.
Dezenas de milhares de nicaraguenses se insurgiram contra Ortega e sua mulher, a vice-presidente Rosario Murillo, em 2018, acusando-os de ter se tornado exatamente o que eles combatiam no passado: líderes de uma dinastia de ditadores. Opor-se ao regime levou centenas de pessoas à prisão, e ao menos 300 manifestantes foram mortos durante protestos.
Anteriormente este ano, 222 presos políticos foram libertados e partiram para o exílio.
O movimento de começar a confiscar imóveis nos dias recentes seguiu-se ao confisco de uma proeminente universidade jesuíta e das prisões de vários sacerdotes. Na segunda-feira, os sandinistas confiscaram uma escola privada de administração de empresas fundada pela Universidade Harvard quase 60 anos atrás. A campanha da ditadura sinaliza que, mesmo cinco anos depois da insurreição fracassada, a dissidência sofre graves consequências.
“Não foi suficiente para ele me aprisionar e me mandar para o exílio, além de me estigmatizar como terrorista e traidora”, afirmou Castillo, que vive atualmente em Baton Rouge, Louisiana.
Murillo, que atua como porta-voz do governo, não retornou a um pedido de comentário. Ela e o presidente têm afirmado que consideram ativistas de oposição terroristas, porque eles tentam depor o regime autoritário bloqueando estradas, paralisando o comércio e ocasionalmente usando violência. Muitos deles, como Castro, são oficialmente foragidos da Justiça.
A comunidade internacional tem criticado amplamente a ditadura de Ortega — as Nações Unidas chegaram a compará-lo ao regime nazista, que cometeu crimes contra a humanidade.
Ortega ajudou a liderar a insurgência que derrubou, em 1979, a ditadura corrupta de Anastasio Somoza Debayle. Seguiu-se uma guerra civil, durante a qual o novo governo sandinista confiscou os inúmeros espólios obtidos inescrupulosamente pela família Somoza. O confisco teve inicialmente intenção de restituir ao povo nicaraguense o que lhe tinha sido…
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