A tensão entre Venezuela e Guiana devido à reivindicação do regime de Nicolás Maduro de anexação de parte do território guianês é considerada um ponto de atenção para o Brasil, que deverá ser o principal mediador caso haja um conflito militar entre os dois países. A possibilidade de conflito, inclusive, seria o principal desafio para o governo do presidente Lula e funcionaria como teste para a política externa brasileira.
A avaliação foi feita em entrevista ao podcast O Assunto por Daniel Souza, comentarista da Globonews, professor do Ibmec e criador do podcast Petit Journal, e pelo cientista político Guilherme Casarões, professor de relações internacionais da FGV-SP.
A Venezuela marcou para o próximo domingo (3) um referendo para que a população decida se apoia a incorporação ao seu território da região da Guiana de Essequibo, que corresponde a 70% do território guianês. A tensão na região fez o Brasil ampliar a presença militar em Pacaraima (RR), na fronteira com a Venezuela.
“Este é um aspecto no qual o presidente Lula vai ter que tomar muito cuidado: como é que ele vai mediar o potencial conflito entre Guiana e Venezuela. O Brasil não tem como se furtar, o Brail não tem como se esconder. O Brasil vai ser claramente o mediador desse tema e vai ter que ser o mediador desse tema com bastante cuidado”, afirma Daniel Souza.
O economista também destaca a força econômica e militar que a Venezuela tem em relação à Guiana, e a proximidade de Lula com Maduro.
“O Brasil é, sem dúvida alguma, o grande mediador dos conflitos fronteiriços da América do Sul. O presidente Lula tem uma proximidade inegável a Nicolás Maduro, e temos a Venezuela, um país muito mais poderoso do ponto de vista econômico e militar, ameaçando o seu vizinho, ameaçando uma parte expressiva do território do seu vizinho”, diz.
Para Guilherme Casarões, da FGV, em eventual conflito, de fato, significará o maior desafio diplomático do governo Lula.
“Mesmo que a gente entenda a antiguidade dessas reivindicações, é um desafio que o Brasil vai ter que enfrentar e que vai ser o grande teste da política externa e da capacidade diplomática externa do governo Lula”, explica.
Brasil amplia presença de militares na fronteira com a Guiana e com a Venezuela
‘Todo o resto vai parecer fichinha’
Segundo Casarões, pesaria a favor do Brasil numa eventual mediação entre os dois países as boas relações de Lula com Maduro e do Brasil com a Guiana.
“Acho que a questão da Venezuela, caso se transforme num conflito militar, numa conflagração bélica na região de Essequibo, que é onde está acontecendo o conflito, todo o resto vai parecer fichinha pro Brasil. Todo o resto: conflito de Israel com o Hamas, conflito na Ucrânia …. Porque a gente tá falando de um conflito na nossa fronteira, que diz respeito aos nossos interesses diretos”, diz.
Lula no Oriente Médio e na Alemanha
Lula – erros e acertos da política externa
O episódio desta sexta-feira (1º) de O Assunto também aborda a política externa de Lula a partir das viagens que o presidente fez a países do Oriente Médio e que fará à Alemanha.
Daniel e Guilherme comentam a rodada de encontros do presidente brasileiro com líderes de países árabes. “O mundo árabe nos oferece hoje um cardápio completo de comércio, investimentos potenciais e protagonismo político”, diz Casarões. “Eu fico preocupado com a certa ambiguidade do Brasil em relação a energias renováveis”, diz o economista, ao falar do convite feito ao país para integrar a Opep+. “Acredito que não deveria aceitar”, completa.
Casarões descreve a relação do governo com líderes autoritários como parte de uma estratégia pragmática da diplomacia brasileira: “A crítica a Bolsonaro era sobre personalização excessiva das relações. Lula preserva uma impessoalidade institucional”. Daniel sinaliza incômodos com a visita de Lula ao príncipe saudita. “Quando Lula vai a Riad, ele assume um fardo excessivo”;
O cientista político avalia que a visita de Lula à Alemanha – marcada para depois da COP28 – é o contrapeso da agenda árabe na geopolítica global. “É um momento importante para sinalizar compromisso com os valores ocidentais”, afirma. E Daniel chama a atenção para o potencial estratégico do encontro com o primeiro-ministro alemão pouco antes da data prevista para a celebração do acordo comercial entre União Europeia e Mercosul (7 de dezembro).
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