A sugestão que tanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva como a ex-presidente Dilma Rousseff (hoje à frente do Banco dos BRICs) fizeram nesta quinta-feira (13) na China de substituir ou, ao menos, reduzir a utilização do dólar como moeda padrão nas transações internacionais não é nova e costuma retornar ao debate sempre que a divisa americana se fortalece.
“Quem decidiu que era o dólar a moeda depois que desapareceu o ouro como paridade? Hoje um país precisa correr atrás de dólar para poder exportar, quando poderia exportar com sua própria moeda e os bancos centrais poderiam cuidar disso. Todo mundo depende de uma única moeda, e tem muita gente mal-acostumada”, questionou Lula durante a posse de Dilma na instituição com sede em Xangai.
De fato, a posição do dólar é mais que dominante. Segundo a última pesquisa trienal do Banco de Compensações Internacionais (BIS, na sigla em inglês), fechada em abril de 2022, a moeda dos EUA esteve envolvida em quase 90% das transações cambiais, as chamadas Forex, ou FX.
Pelo menos 85% das negociações nos mercados à vista, a termo e de swap eram feitas em dólar no ano passado em uma das pontas das transações. Na pesquisa trienal de 2019, essa fatia estava em 88%. Para fazer uma comparação, a participação do euro, a segunda divisa mais negociada, chegou a 31%, ante 32 na pesquisa anterior. Mas em 2010 estava no pico de 39%.
A pesquisa identificou uma tendência semelhante de perda de força com o iene japonês, enquanto a libra esterlina estava mantendo uma participação praticamente constante ante os levantamentos anteriores.
A grande mudança aconteceu exatamente com o renminbi chinês, cuja participação avançou de menos de 1% nas transações há 20 anos para mais de 7% na atual pesquisa do BIS.
A respeito do domínio do dólar no comércio global e nas transações financeiras internacionais, um estudo do FMI estimou que, no período 1999-2019, o dólar representou 96% das faturas comerciais nas Américas, 74% na região da Ásia-Pacífico e 79% no resto do mundo. A única exceção era a Europa, onde o euro ainda é dominante.
Uma área em que o papel do dólar americano tem perdido participação é na composição das reservas cambiais oficiais, embora ainda permaneça na liderança. No início do segundo trimestre de 2022, ao moeda representava menos de 60% dessas reservas cambiais, a menor fatia dos últimos 20 anos, segundo o BIS.
Confiança e liquidez
O que explica a permanente dominância? Um paper recente do Federal Reserve (Fed, o Banco Central americano) apontou que, durante a maior parte do século passado, o papel proeminente do dólar na economia global foi sustentado pelo tamanho e força da economia americana, sua estabilidade e abertura ao comércio e fluxos de capital e pela forte defesa dos direitos de propriedade e do estado de direito.
“Como resultado, a profundidade e a liquidez dos mercados financeiros dos EUA são inigualáveis, e há uma grande oferta de ativos denominados em dólares extremamente seguros”, diz o documento.
O “think tank” Carnegie Endowment for International Peace, por sua vez, afirma que o mundo usa o dólar porque os Estados Unidos têm os mercados financeiros mais profundos e flexíveis, a governança corporativa mais clara e transparente e a menor quantidade de discriminação entre residentes domésticos e estrangeiros.
E um artigo que acompanhou a pesquisa trienal do BIS acrescentou entre esses fatores o fato de a divisa desempenhar uma função de moeda-veículo para as transações cambiais, o que significa que os pares de moedas que não o dólar americano não são trocados diretamente, mas por meio da moeda dos EUA. De acordo com algumas estimativas do BIS, esse papel do dólar gera pouco menos de 40% de seu volume de negócios nos mercados FX.
Também é lembrada a pegada do dólar nos mercados de financiamento offshore, onde os participantes do mercado financeiro contraem dívidas ou obtêm empréstimos em moeda estrangeira.
Cerca de metade de todos os títulos de dívida internacional e empréstimos transfronteiriços emitidos nestes mercados de financiamento offshore são denominados em dólar americano.
Troca é improvável
Com as mudanças na economia global pelas seguidas crises, as relações comerciais cada vez mais protecionistas e a influência crescente da…
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