Depois que o Banco Central (BC) brasileiro iniciou o ciclo de flexibilização monetária com um corte de juros mais arrojado do que boa parte do mercado esperava, o economista-chefe de mercados emergentes do Citi, David Lubin, avalia que a decisão pode ter aberto a porta a novas surpresas em outras economias.
Apesar disso, ele diz ter dúvidas sobre o impulso à atividade econômica, dado o freio de juros reais que, paradoxalmente, tendem a subir por conta da desaceleração dos preços, mais rápida do que a redução das taxas nominais.
Em entrevista ao Estadão/Broadcast, Lubin apresentou sua visão sobre a perda de tração da economia chinesa, pressionada por uma grande crise de confiança, e se mostrou menos empolgado do que a média do mercado em relação à situação fiscal do Brasil.
Para ele, o arcabouço fiscal ainda terá que ser testado em condição econômica menos favorável, que exigirá maior esforço do governo para entregar a promessa de superávit primário de 1% do Produto Interno Bruto (PIB) no último ano do mandato.
Veja abaixo os principais trechos da entrevista:
O início do ciclo de flexibilização monetária, com cortes de juros mais arrojados do que se esperava no Brasil e no Chile, deve impulsionar a atividade, apesar do ambiente internacional difícil para produtores de commodities?
Nos próximos meses, as expectativas de inflação, provavelmente, vão cair mais rápido do que os juros nominais nos países emergentes. Isso significa que, em geral, a taxa de juros real ex-ante – ou seja, descontada das expectativas para a inflação – vai subir. Acho que precisamos estar abertos para a possibilidade de as decisões dos bancos centrais do Chile e do Brasil terem aberto a porta para novas surpresas. Há chance de a taxa de juros cair mais rápido do que estamos prevendo atualmente. Mesmo assim, por conta dessa situação paradoxal, na qual, apesar da queda dos juros nominais, a taxa real sobe em razão da queda mais acelerada das expectativas, não estou seguro de que o ambiente favorável de desinflação vai apoiar o crescimento.
Por que você espera uma queda adicional das expectativas?
Temos um ambiente benigno para a queda da inflação nos mercados emergentes. Desde maio, particularmente, quase todos os países publicaram índices de inflação abaixo do esperado. Exceção a países como a Índia, a inflação nos emergentes está, em geral, se comportando bem. Um dos motivos é que os preços das commodities estão recuando, e nos mercados emergentes os bens de consumo têm peso maior do que os serviços na inflação ao consumidor. Os núcleos de inflação dão, na maioria dos países, sinais de desaceleração rápida, embora continue resistente no Brasil. Temos um cenário de desinflação confiável nas economias emergentes, e acho que vai continuar assim por bom tempo. Evidentemente, há riscos como o El Niño e a possibilidade de repique nos preços das commodities por a Rússia se recusar a renovar o acordo de exportações de grãos.
A desaceleração da economia chinesa vai contribuir mais para a desinflação do resto do mundo?
A China já tem um problema sério de deflação nos preços aos produtores. Na inflação ao consumidor, caiu em base anual para zero na última medição (relativa a junho). Acho que as autoridades chinesas vão ficar muito desapontadas se houver uma deflação persistente nos preços ao consumidor. Quando a confiança está baixa e os consumidores buscam por barganhas, se os preços começam a cair, o risco é de uma espiral negativa: as famílias adiam o consumo porque percebem que os preços estão em queda; e os preços caem porque as famílias estão adiando o consumo. Não estamos prevendo isso, mas com certeza é um risco. De qualquer maneira, se a deflação na China se tornar óbvia, haverá um efeito baixista para a inflação do resto do mundo, em particular nos países emergentes.
Isso, de certa forma, já não acontece no atacado?
Sim. A queda do índice de preços ao produtor na China tende a levar a um declínio da inflação ao produtor em outros países. Ao mesmo tempo, a queda dos índices de preços ao produtor tende a preceder a queda dos preços ao consumidor em qualquer lugar. Então, o fato de termos deflação nos preços ao produtor na China é, por si só, um…
Read More: ‘Há chance de os juros caírem mais rápido do que estamos prevendo’, diz