Nas três horas de depoimento à CVM, ao qual o UOL teve acesso, Gutierrez afirma que havia uma linha de comando segundo a qual nenhuma decisão importante era tomada sem o conhecimento e aprovação de Beto Sicupira.
O ex-CEO das Americanas, que ficou no cargo oficialmente até dezembro de 2022, afirma que, durante toda a sua gestão, sua ligação com Beto Sicupira foi “contínua” e “muito intensa” e se estendeu mesmo depois que o sócio deixou a presidência do conselho de administração da companhia, em 2020.
“O Beto, ou você não se dá com Beto ou se dá com Beto. É uma pessoa de personalidade muito, muito forte. Se eu estava há 20 anos me relacionando com Beto no cotidiano, não dá para agora eu vou falar com [Eduardo] Saggioro [que substituiu Sicupira na presidência do conselho de administração]”, contou Gutierrez à CVM, em março.
Desde janeiro, a empresa está em recuperação judicial com mais de R$ 40 bilhões em dívidas declaradas, além de outros quase R$ 7 bilhões em debêntures. Em 11 de janeiro, foi revelado pelo substituto de Gutierrez, Sergio Rial, que ficou somente nove dias no cargo, que havia “inconsistências contábeis” de R$ 20 bilhões – isto é, o valor não estava registrado no balanço como dívida.
Em março, quando o depoimento de Gutierrez foi tomado, o caso não era tratado abertamente como fraude — tanto que a palavra sequer foi pronunciada pelos funcionários da autarquia.
À CVM, o ex-CEO negou ter conhecimento das manobras para maquiar o balanço e esconder ao menos R$ 20 bilhões de dívidas e alegou não ter envolvimento direto com as áreas financeira e contábil. A negativa de conhecimento das operações que originaram o rombo foi repetida ao delegado da PF Acen Amaral Vatef em 21 de junho.
Com passaportes brasileiro e espanhol, Miguel Gutierrez está em Madri, onde estaria sendo submetido a um tratamento médico, de acordo com seus advogados.
Read More: Ex-CEO das Americanas diz que obedecia a Sicupira