BRASÍLIA – O município de Itabira, no interior de Minas Gerais, inovou ao gastar seu dinheiro no combate à desigualdade. Para isso, limitou a despesa com servidores em 35% do orçamento e direcionou os recursos para tirar famílias da pobreza. A cidade do minério de ferro e onde nasceu o poeta e funcionário público Carlos Drummond de Andrade vai na contramão da maioria dos municípios brasileiros, que consumiu o dinheiro com pessoal.
A prefeitura da cidade mineira criou a “Facilita”, uma moeda social eletrônica com circulação restrita ao comércio local. Famílias de baixa renda recebem um cartão que é carregado todo mês com um valor de R$ 140. A moeda só pode ser usada na compra de alimentos, produtos de higiene e gás de cozinha. Por sua vez, os comerciantes recebem do município o dinheiro das vendas.
Ao mesmo tempo, a prefeitura contrata as mulheres beneficiadas pelo programa para trabalharem meio período como auxiliares de cozinha, auxiliares ambientais e auxiliares de serviços gerais durante um ano, por R$ 660 mensais. No restante do dia, elas fazem curso de qualificação profissional. O objetivo é que as pessoas de baixa renda saiam do programa e consigam empregos formais e independência financeira.
E muitas delas saíram. A moradora Leidiane Xavier dos Santos, 38 anos, começou a usar a moeda social em 2021. Com duas crianças pequenas em casa, ela fez um curso de qualificação. Depois de participar do programa, foi contratada como auxiliar de cozinha em um restaurante. Agora, sonha em abrir uma padaria. “A primeira coisa que eu fazia era comprar frutas para as crianças. Então, me ajudou bastante, porque me deu independência e eu consegui meu objetivo, que era ter um salário”, conta a moradora.
Em três anos, foram seis mil famílias beneficiadas. A prefeitura já gastou R$ 11 milhões com o programa. De acordo com a administração, 500 famílias saíram da extrema pobreza e da pobreza e já não dependem mais da moeda social.
“As pessoas que estão em situação de vulnerabilidade dificilmente acessam o mercado de trabalho. Muitas nunca tiveram carteira assinada e, com o programa, essas mulheres saíram da dependência econômica e financeira”, diz a secretária de Assistência Social de Itabira, Nélia Cunha.
Os municípios brasileiros nunca receberam tanto dinheiro público. Mesmo assim o Pais segue um dos mais desiguais do mundo. Por que razão? O Estadão percorreu 2.312 quilômetros, passando por 15 cidades do Distrito Federal, Goiás e Tocantins, em busca de respostas e de exemplos de como mudar essa realidade.
Enquanto a maior parte das cidades brasileiras usa todo dinheiro para inchar a máquina, algumas políticas públicas adotadas mostram o caminho para diminuir as desigualdades.
O caso de Itabira é um dos exemplos, ao lado de outras iniciativas adotadas no País. A criação da moeda social digital veio logo após outra inovação no Brasil: o Pix. O pagamento instantâneo, via celular, foi lançado pelo Banco Central em 2020. Na prática, mais pessoas tiveram acesso a uma conta bancária, transferindo e recebendo dinheiro. Em agosto deste ano, o Pix atingiu 140,6 milhões de usuários, de acordo com o Banco Central.
O Pix promoveu a inclusão financeira para 71 milhões de brasileiros até dezembro de 2022, e a maioria das transferências foi feita com valores inferiores a R$ 100,00. Apesar do avanço, ainda há desigualdade. Entre os brasileiros com renda de até um salário mínimo, mais de 60% da população já enviou ou recebeu pelo menos um Pix. Nas faixas de maior renda, o porcentual é de mais de 80%.
“O Pix promoveu uma mudança positiva para as classes mais baixas porque o custo da transferência ficou menor”, diz Lauro Gonzalez, coordenador do Centro de Estudos em Microfinanças e Inclusão Financeira da Fundação Getulio Vargas (FGV). “Na mesma direção, o auxílio emergencial da pandemia colocou muita gente dentro do sistema em um intervalo curto de tempo.”
Para o especialista, programas como a moeda social local têm um efeito maior na redução da desigualdade e na transição das pessoas para o mercado de trabalho do que políticas nacionais, como o Bolsa Família. “Esses programas têm a junção da inclusão digital com a transferência de renda e podem refletir melhor o que acontece em nível local.”
Carteira de habilitação de graça para pessoas de baixa renda
Outra medida para enfrentar a desigualdade no…
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