Bloomberg Línea — O crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil acima das expectativas no segundo trimestre surpreendeu a maior parte dos analistas de mercado. Uma exceção foi David Beker, chefe de economia para Brasil e de estratégia para América Latina do Bank of America (BofA).
Beker revisou a estimativa para o PIB dias antes de os dados serem divulgados, no começo de setembro, e quase acertou o resultado. O crescimento no período foi de 0,9%, pouco acima do 0,8% projetado pelo BofA e distante do 0,3% do consenso do mercado. Depois disso, o mercado elevou as estimativas para a alta da atividade econômica brasileira em 2023 para perto de 3%.
A visão de David Beker para o Brasil em 2024 também é mais positiva do que a média do mercado. Ele espera um PIB de 2,2% no próximo ano, acima do 1,5% de consenso, e um déficit primário menor do que a maioria dos analistas.
No campofiscal, Beker prevê um déficit primário de 0,4% do PIB para 2024, enquanto o mercado projeta 0,8%. A meta do governo, indicada no Projeto de Lei Orçamentária Anual para 2024 (PLOA), é zerar o déficit, com intervalo de tolerância de -0,25% a 0,25% do PIB, previsto no arcabouço fiscal.
“Temos que partir do princípio de que o arcabouço tem que ser desafiador mesmo. Se existe uma meta fácil de cumprir, ela está errada. Acho que será desafiador, mas a dificuldade de cumprimento já era esperada”, disse o analista em entrevista à Bloomberg Línea.
“A minha previsão de 0,4% não está tão distante do 0,25% permitido. É difícil, mas entendo que o governo e o [Fernando] Haddad vão continuar tentando.”
Beker afirmou que a preocupação com a questão fiscal por investidores internacionais é menor do que pelos domésticos. Assim, o Brasil estaria bem posicionado para receber grandes fluxos de capital.
Alguns aspectos da economia podem estar melhores no Brasil, destacou o analista, o que explicaria o crescimento forte e acima do esperado pelo mercado em 2022 e 2023 e as chances de 2024 continuar a surpreender.
Entre eles está a capacidade de crescimento da economia sem gerar inflação maior, chamada de PIB potencial, assim como uma taxa natural de desemprego menor, em que a inflação também não é pressionada. Isso explicaria a força do mercado de trabalho atual.
Leia a seguir abaixo os principais pontos da entrevista.
Bloomberg Línea: O que o levou a projetar um PIB de 3% para este ano antes de outros analistas e da divulgação dos dados oficiais do segundo trimestre?
David Beker: Os erros de previsão sobre o crescimento econômico, principalmente na margem, não têm acontecido só no Brasil. Temos sido surpreendidos pela resiliência do mercado de trabalho ao redor do mundo e pela performance do setor de serviços pós-covid… Então tem um componente geral.
Quando olhamos para o Brasil, temos a surpresa com o agronegócio. Ele foi, sim, uma explicação importante. Fomos surpreendidos pelo quão robusta foi a safra na primeira metade do ano. Também tem outra seara: talvez tenha havido mudanças estruturais que estão auxiliando a economia, e os modelos de previsão ainda não respondem a elas. Alguns dos pontos que estão em revisão é o PIB potencial, a taxa de desemprego natural, a taxa de juros neutra… Há uma incerteza nas modelagens.
Como o senhor vê este segundo semestre?
Já vivemos o melhor momento do ano e é natural uma desaceleração adiante. Os dados na margem mostram uma economia mais fraca. Para o PIB fechar em 3%, por exemplo, assumimos na previsão do BofA alguma desaceleração no restante do ano. Se assumir uma estabilidade, o PIB vai a 3,1%. Se assumir aceleração, teria até que aumentar. Mantivemos os 3%, esperando desaceleração.
Para 2024, tenho projeção acima do mercado. Espero crescimento de 2,2% para o PIB, sendo que o consenso está em 1,5%, vindo de 1% antes, quando estávamos em 1,8%. Talvez também pelo medo de ser surpreendido para cima, o mercado também está revisando.
Na revisão acertada sobre o PIB, houve algum dado específico que a justificou?
Foi um conjunto de dados. Vimos indicadores de confiança mais fortes, a percepção de medidas implementadas do governo, como o Desenrola [programa de renegociação de dívidas]. Quando a gente faz o ‘call’, faz do ano, então a gente estava tentando olhar para o todo.
Temos um indicador próprio de atividade, e ele estava mais forte. Os inputs desse indicador nosso são alguns dados antecedentes, que aí…
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