Garantir um crescimento sustentado acima de 3% ao ano e uma inflação dentro da meta nos próximos dez anos não vai depender exclusivamente da reforma tributária, que está em tramitação no Senado, e do arcabouço fiscal, aprovado pelo Congresso e já em vigor.
“É preciso ir além”, diz Sílvio Campos Neto,
economista e sócio da Tendências Consultoria. Outros avanços necessários são um
arranjo fiscal mais firme; um Banco Central atuando de forma mais tranquila,
sem interferências do governo; realizar a reforma administrativa e promover a
abertura comercial, com redução das barreiras.
Segundo Alessandra Ribeiro, também economista e sócia da Tendências Consultoria, nesse panorama a política doméstica se aproxima, ao longo dos anos, da “grande moderação”, ou seja, direita e esquerda se aproximam no apoio às reformas estruturais.
“Neste cenário, além da contemplação de efeitos mais robustos da reforma tributária para o PIB potencial brasileiro, com exceções menores em relação ao texto aprovado na Câmara e, consequentemente, alíquota mais reduzida do Imposto sobre Valor Adicionado (IVA), há os efeitos da aprovação do acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia”, afirma a economista.
Para este ano, de acordo com o último relatório Focus, a mediana das expectativas de crescimento sinaliza uma alta de 2,92% no PIB, uma inflação de 4,86% e um dólar a R$ 4,95 em 31 de dezembro.
Para 2024, o ponto médio das projeções de crescimento está em 1,5%, a inflação em 3,86% e o dólar a R$ 5 no fim do ano.
Avanços na área fiscal e reformas na tributação
A concretização do cenário básico da Tendências Consultoria, que projeta um crescimento médio de 2% ao ano entre 2023 e 2032, vai depender também de avanços na área fiscal. Esse cenário tem 65% de probabilidade, segundo a consultoria.
“Esse cenário foi construído a partir do relativo
sucesso do governo na aprovação de medidas que, no limite, reforçam o poder de
arrecadação do Estado brasileiro. Esse componente político permitiria que o
resultado primário voltasse mais rapidamente ao território positivo,
contribuindo para a queda do ritmo de endividamento esperado para os próximos
anos”, explica Ribeiro.
O avanço da reforma tributária também é importante, destaca Campos Neto, mesmo com as mudanças introduzidas ao longo da tramitação do projeto. Uma delas foi tornar dual o IVA, que vai substituir a PIS/Cofins, o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI, federal), sobre serviços (ISS, municipal) e sobre circulação de mercadorias e serviços (ICMS, estadual).
“Um único IVA era melhor, mas a reforma alinha o Brasil aos países que têm as melhores práticas tributárias. Também elimina a guerra fiscal, reduz bastante a chance de judicialização das questões tributárias e traz ganhos de eficiência e produtividade”, diz o economista.
Uma preocupação da Tendências é em relação à agenda de recuperação da arrecadação. A consultoria trabalha também com um cenário mais pessimista, com probabilidade de 25% de ocorrência, no qual o governo sofre seguidas derrotas legislativas na sua tentativa de recompor a receita tributária. É um panorama que não contempla o avanço dessa reforma.
Segundo Ribeiro, a percepção de imobilismo do governo no campo arrecadatório traria uma nova onda de desconfiança por parte dos agentes econômicos.
“A pressão política, então, apareceria nas tentativas de alteração das metas fiscais e outras políticas, com destaque para a política monetária via nomeação dos diretores do BC, o que seria percebido como inflexão do pragmatismo da equipe econômica”, cita.
Relacionamento mais tranquilo com o Banco Central
Uma das necessidades para assegurar um cenário mais otimista para a economia brasileira, segundo especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo, é um relacionamento mais tranquilo entre o governo e o Banco Central.
“A visão técnica tem de prevalecer sobre a política”, explica o economista-sênior do Julius Baer Family Office (JBFO), Gabriel Fongaro. Até agora, com o presidente Roberto Campos Neto à frente da instituição, tem prevalecido a visão técnica – mas não sem sobressaltos.
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