BRASÍLIA – O Brasil tem jeito. Essa é a resposta apontada por especialistas e “cabeças” notáveis que pensam o País. Mas não acaba por aí. A afirmação sempre vem acompanhada de condicionantes. O Brasil tem jeito se investir em educação de qualidade. O Brasil tem jeito, mas tem de enfrentar os privilégios de quem fica com muito dinheiro do orçamento. O Brasil tem jeito, porém, não fez o dever em áreas essenciais como segurança pública.
Na série de reportagens especiais Desigualdade – o Brasil tem jeito?, o Estadão mostrou que os municípios nunca receberam tanto dinheiro, mas a desigualdade se mantém no interior. As prefeituras aumentaram os gastos com funcionários sem resolver problemas básicos da população. Além disso, o orçamento do governo Lula reforça as distorções.
Mas bons exemplos não faltam em municípios que resolveram investir o dinheiro público no combate à desigualdade. No aniversário de 35 anos da Constituição de 1988, o País avançou, mas ainda enfrenta o dilema de como financiar direitos.
Maílson da Nóbrega: ‘É preciso reduzir os gastos e dar um basta na marcha de prefeitos a Brasília’
Maílson da Nóbrega, ex-ministro da Fazenda (1988 a 1990): A preocupação com a desigualdade foi um dos pontos básicos que orientaram a Constituição. Só que a Constituição fez isso da pior maneira possível porque prevaleceu a ideia de que se reduz a desigualdade aumentando gasto. Não é o gasto público que impulsiona a economia, é a produtividade. O Brasil só vai voltar a crescer se atacar os fatores que hoje emperram a economia, e o principal deles é o problema fiscal. É preciso acabar com as vinculações de gastos na saúde e educação e dar um basta na marcha dos prefeitos a Brasília, que fazem pressão por mais dinheiro e se tornaram insaciáveis. Isso depende de reformas para restabelecer a capacidade de o Estado gerir o Orçamento, ações para melhorar a qualidade da educação e a criação de um ambiente concorrencial que inclua a inovação. Eu acho que o Brasil tem jeito. O País tem dado demonstrações de que é possível gerar crescimento com políticas bem orientadas. O grande exemplo é o agronegócio. O Brasil hoje supera os Estados Unidos na exportação de sete produtos e pode chegar a nove. Se isso tudo aconteceu em um país tão complicado como o Brasil, não há por que se pensar que não possa acontecer em outras áreas.
Arminio Fraga: ‘Sem encarar grandes questões, Brasil tem chance de dar bem errado’
Arminio Fraga, ex-presidente do Banco Central (1999 a 2003): O que falta mesmo é prioridade. A Previdência e a folha de pagamento do setor público somam quase 80% do gasto, e fora isso têm os subsídios tributários. É um ponto totalmente fora da curva em qualquer país do planeta. Para fazer o debate para valer, o governo tem que ter a coragem de cutucar essas áreas, e eu não vejo nenhum sinal de que isso vai acontecer. Existem cenários em que o Brasil tem jeito, mas infelizmente existem cenários em que o Brasil se complica bastante ou então fica medíocre. Sem encarar essas grandes questões, não vai ter jeito para valer e vão se repetir os últimos 40 anos, em que a renda per capita cresceu mais ou menos igual à americana, ou seja, melhorou, mas não houve uma convergência para os padrões mais elevados do mundo. O Brasil tem chance de dar certo, mas também tem chance de dar bem errado.
Vilma Pinto: ‘Precisamos não apenas investir mais, mas gastar de forma eficiente’
Vilma Pinto, diretora da Instituição Fiscal Independente do Senado: O Brasil tem jeito e estamos caminhando a passos lentos na direção correta. Tivemos avanços recentes em transferência de renda. Por outro lado, o País carece de melhores condições em diversos outros temas, como na questão tributária. O Brasil tem uma carga tributária elevada e uma desigualdade de renda ainda bastante elevada. Isso indica que não estamos usando de forma eficiente todos os nossos potenciais, seja em arrecadação, seja em provisão de políticas públicas. O Brasil precisa não apenas investir mais, mas gastar de forma eficiente. A discussão atual sobre os pisos constitucionais de saúde e…
Read More: Brasil só tem jeito se mudar prioridades e enfrentar privilégios, dizem