Foram cerca de 27 anos de dúvida desde os primeiros sintomas, aos 8 anos, até o diagnóstico correto da doença de Ana Paula Morais da Silva, hoje com 39 anos. Ela, que vive com esclerose múltipla (entenda abaixo), conta que recebeu muitos diagnósticos errados durante a vida.
“Quando tive o primeiro surto, passei por vários médicos, ortopedistas, clínicos gerais e cada um dava uma teoria diferente. Depois de um ano, suspeitaram de um possível câncer”, diz.
Ana Paula conta que depois de ser examinada por um neurocirurgião, ele descartou o câncer. Mas, falou que ela poderia ter uma doença neurodegenerativa. Aos 33 anos, foi a primeira vez que a moradora de Ceilândia ouviu o termo.
Por dois anos, Ana Paula recebeu tratamento para a neuromielite óptica – doença autoimune rara e inflamatória que atinge o sistema nervoso central, especialmente o nervo óptico, levando à perda de visão e incapacidades graves que podem levar à morte. No entanto, depois da morte da sua mãe, como a esclerose é ligada ao emocional, Ana Paula apresentou uma piora. Somente aos 35 anos recebeu o diagnóstico correto.
“É literalmente uma luta diária. Eu nem digo que vivo um dia de cada vez, porque vivo ‘um meio dia’ de cada vez: às vezes acordo bem e, no meio do dia, já não estou bem”, conta.
No mundo, são aproximadamente 300 milhões de pessoas que vivem com doenças raras e há entre 6 mil e 8 mil tipos de enfermidades diferentes conhecidas, segundo o Ministério da Saúde. Nesta semana, Brasília recebe o 5° Congresso Ibero-americano de Doenças Raras (saiba mais abaixo).
Problemas enfrentados pelos ‘raros’
- Acesso ao diagnóstico e tratamento
A médica geneticista Maria Teresa Alves da Silva Rosa, que também é referência técnica distrital (RTD) de doenças raras, explica que o maior desafio dos pacientes é o acesso a um serviço de referência que ofereça atendimento especializado e diagnóstico e tratamento corretos.
“Quanto mais rápido o diagnóstico e tratamento dos pacientes com doenças raras, melhor o prognóstico. Para garantir a qualidade de vida desses pacientes é essencial um acompanhamento multidisciplinar, além de reabilitação e cuidados paliativos quando necessários”, diz Maria Teresa Rosa.
- Preconceito e empregabilidade
Além do preconceito, segundo Ana Paula Morais da Silva, conseguir um emprego vivendo com uma doença rara é complicado.
“Ao receber o diagnóstico, alguns pacientes são excluídos do mercado de trabalho automaticamente. Somos vistos como uma bomba relógio que pode deixar a empresa a qualquer momento”, diz Ana Paula.
Para a paciente, que fez pedagogia, se houvesse uma lei que rege a contratação de pessoas com doenças raras como a que define a admissão de pessoas com deficiência, poderia existir mudanças e mais representatividade no mercado de trabalho.
A questão de não haver uma legislação sobre o caso de doenças raras faz com que os raros não consigam acesso a direitos básicos como, por exemplo, ao passe livre no transporte público e à aposentadoria. “A gente fica em um limbo”, diz Ana Paula Morais.
Segundo a Secretaria de Saúde do DF (SES-DF), 5% da população de Brasília vive com algum tipo de doença rara, ou seja, aproximadamente 150 mil pessoas. Para atender os pacientes, o Sistema Único de Saúde (SUS) tem como porta de entrada o Hospital de Apoio de Brasília (HAB), no Noroeste.
“O HAB é o único serviço de referência em doenças raras habilitado dentro da SES pelo Ministério da Saúde”, aponta a nota da Secretaria de Saúde do DF (SES-DF). De acordo com a pasta, o paciente pode ser encaminhado para outras unidades:
- No caso de crianças: Hospital da Criança de Brasília José Alencar (HCB)
- Medicina fetal: Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB)
- Atendimentos de genética e doenças raras: Hospital Universitário de Brasília (HUB)
- Terapia de reposição enzimática: Hospital Regional da Asa Norte (Hran)
Em 2023, foram cerca de 2,5 mil atendimentos atendimentos de pessoas com doenças raras, segundo Secretaria de Saúde. No entanto, Ana Paula Morais conta que conseguir o tratamento multiprofissional na rede pública é concorrido, assim como o acesso aos…
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