As ideias separatistas profanadas pelo governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Partido Novo), merecem todo o nosso repúdio e exige observar que elas vêm em um contexto de ascensão fascista e confirmam um longo processo histórico de visões supremacistas, racistas e xenófobas que perduram no Brasil.
É preciso situar a xenofobia vomitada por sujeitos políticos das classes dominantes brasileiras como reflexo de um processo histórico em que as desigualdades regionais foram edificadas em função dos privilégios de alguns em contraste ao sacrifício de muitos. Portanto, não há nada de natural, nem de idílico nesse processo. O que há é muita espoliação, manipulação e vergonhosa exploração de alguns povos e regiões do Brasil.
Cito aqui, entre tantos, dois autores que nos ajudam a compreender as razões desse processo de desigualdades regionais e como ela se vincula ao caráter do capitalismo dependente brasileiro.
:: Xenofobia contra nordestinos revela forte racismo no Brasil, dizem especialistas ::
Desigualdade regional
O primeiro deles é Francisco de Oliveira, que parte do conceito do desenvolvimento “desigual e combinado” do capitalismo dependente brasileiro para explicar essa situação nas obras “Crítica à Razão Dualista” e “Elegia para uma Re(li)gião”.
No primeiro livro, esse pernambucano arretado, professor emérito da Universidade de São Paulo (USP), aborda teoricamente como a desigualdade regional é produto do desenvolvimento capitalista brasileiro e como essas desigualdades se completam. Já no segundo texto, ele avança nessa ideia e mostra como a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) terminou servindo à expansão do capital paulista sobre o Nordeste, contrariando sua ideia original de desenvolvimento da região Nordeste como forma de superar as desigualdades.
Outro autor fundamental para compreender esse processo em suas origens é Wilson Cano e seu seminal “Desequilíbrio regionais e concentração industrial no Brasil”. Outra obra de Wilson Cano importante é “Raízes da Concentração Industrial em São Paulo”.
Aprendemos com essas leituras que os processos social e regionalmente desiguais de desenvolvimento – necessários à edificação de um capitalismo dependente, subalterno aos interesses internacionais no Brasil – forjam, produzem as bases materiais de um Nordeste economicamente “atrasado”, “subdesenvolvido” e “empobrecido”, na linguagem economicista, empobrecidas por visões liberais.
Sim. É preciso reforçar aqui. Foi a manutenção no Nordeste de estruturas econômicas “pré-capitalistas que permitiu ao Brasil se inserir como dependente e subalterno ao centro do capitalismo mundial. Tudo articulado por elites econômicas locais e nacionais, serviçais do domínio internacional imperialista.
Wilson Cano, por exemplo, mostra que, em torno de São Paulo, criou-se um “cinturão verde” de pequenos produtores agrícolas imigrantes que gerou renda, permitindo a formação de um mercado consumidor. Teria sido esse mercado consumidor que permitiu o surgimento da indústria paulista.
:: ‘Traidor da pátria’, diz Flávio Dino sobre fala separatista de Romeu Zema contra o Nordeste ::
Distribuição de terras
Por que o mesmo mercado consumidor não emergiu no Nordeste? A reposta é simples e dilacerante para quem tem o mínimo de consciência social, política e humanista: porque aqui não se distribuiu terras a italianos, alemães, poloneses, espanhóis etc., com a ideia de branqueamento da população, pela vergonha da miscigenação que as elites econômicas sentiam frente aos eugenistas europeus.
Aqui, no Nordeste, a terra negada aos ex-escravizados foi doada em latifúndios aos amigos do rei, responsáveis pelos genocídios contra os povos indígenas, ocupantes originários dessas terras. A terra retirada de seus ocupantes foi negociada em cartório para sesmeiros genocidas expandirem seus campos de cana e de gado.
Essa é que é a verdade.
Os ex-escravizados ocuparam as margens das grandes fazendas, recebendo a paga por seu trabalho em Meia, Terça, Conga, Sorte… ou nos barracões em mantimentos. Sem circulação monetária, não se formou condições de…
Read More: O separatismo e a questão Nordeste: um recorte contemporâneo