Sturzenegger, que comandou o BC sob Macri, diz que debate sobre dolarização mostra desejo de fim da alta descontrolada de preços
Na avaliação de Federico Sturzenegger, que foi presidente do BC (Banco Central) da Argentina de 2015 a 2018, no governo de Mauricio Macri, o debate sobre a dolarização no país deve ser avaliado por representar a prioridade da população hoje.
“É uma mensagem que indica a existência de uma vontade muito forte de reduzir a inflação”, afirmou em entrevista por escrito ao Poder360. O 1º turno da eleição para presidente no país será em 22 de outubro.
A proposta de dolarização é defendida pelo candidato a presidente Javier Milei. Sturzenegger não disse se acha viável colocá-la em prática nem se seria a melhor alternativa. Mas o ex-presidente do BC cobrou os que se opõem a essa ideia: “Deveriam ser mais explícitos em demonstrar a forma como vão reduzir a inflação em vez da ênfase na crítica à proposta”.
Para Sturzenegger, reduzir a inflação passa por tirar o BC “do alcance dos políticos”. Ele quer uma autoridade monetária autônoma. Na sua avaliação, a raiz dos impasses econômicos do país é a manutenção de privilégios de diferentes grupos, incluindo sindicalistas e empresários.
O ex-presidente do BC colaborou com a candidata Patricia Bullrich. Também escreveu no X (ex-Twitter) que tem “uma relação de respeito mútuo” com Milei e que o candidato ajuda o debate. Sturzenegger criticou duramente o governo do presidente Alberto Fernández, que tem como candidato a presidente o ministro da Economia, Sergio Massa.
Poder360 – Quais são os maiores desafios que a economia da Argentina enfrenta hoje?
Federico Sturzenegger – Ao contrário do que normalmente se pensa, o problema da Argentina é que é um país excessivamente estável.
Estável? Como assim se a inflação está fora de controle?
Sim, é verdade que, superficialmente, a Argentina parece muito instável. Mas, na sua raiz, é muito estável. Se olharmos para os sindicalistas argentinos, veremos que eles são os mesmos década após década. E quando digo os mesmos, quero dizer literalmente. São as mesmas pessoas. Isso também vale para os empresários. Se olharmos para as organizações empresariais, seus líderes são os mesmos. Ano após ano. Ou seja, a Argentina é um país com uma ideia muito clara de como se organizar. Infelizmente, é uma forma muito prejudicial para a maioria dos argentinos, porque é uma organização que privilegia o poder estabelecido e não a inovação, a mudança ou a possibilidade de o mercado encontrar formas de melhorar a produtividade e a qualidade de vida da população.
Esse tipo de organização é uma particularidade da Argentina?
Na verdade, não. Se você ler o famoso livro de Daron Acemoglu e James Robinson, “Por que as nações fracassam”, verá que as sociedades com status quo são a coisa mais comum no mundo. É por isso que nem todos os países são tão ricos quanto a Suíça ou a Noruega. E por que não são? Não seria suficiente copiar o que eles fazem? Claro que seria. Mas quase ninguém quer, porque isso significaria perder os privilégios que o sistema concedeu. Quando uma sociedade entra nesse caminho, fica presa ali. A Argentina está nisso há várias décadas.
Poderia dar exemplos de outros países assim?
Existem milhares. Cuba e Coreia do Norte. São sociedades horríveis para o seu povo e provavelmente deliciosas para os seus governantes. Europa Oriental, comunismo, apartheid na África do Sul etc. É interessante que muitas dessas sociedades tenham mudado por causa de fatores externos. A queda da União Soviética foi o que permitiu a mudança na Europa Oriental, o bloqueio [à África do Sul] a queda do apartheid e assim por diante. Há mudanças internas, com Deng Xiaoping na China, por exemplo, e Margaret Thatcher no Reino Unido. Mas são menos frequentes.
Essa forte tendência à manutenção do status quo é comum a todos os países latino-americanos?
Eu diria que, em termos gerais, sim. A propósito, muito menos do que na África, mas mais do que em outras regiões. Por isso acho que o crescimento na América Latina deixa tanto a desejar.
O que seria necessário copiar dos países mais ricos para replicar o desenvolvimento?
Acemoglu e Robinson falam sobre instituições econômicas inclusivas: regras que são iguais para todos, em que não há privilégios para ninguém e ganha quem melhor servir a…
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